quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Considerações importantes sobre a prática com a literatura no espaço escolar

Quando incentivamos a leitura através dar investir na arte. Ou seja, optamos por priorizar e acreditar no potencial subjetivo de cada estudante e no texto artístico como um meio eficaz para garantir a permanência do leitor.

Entretanto, para iniciarmos nossas reflexões sobre a prática da literatura em sala de aula, precisamos, antes, nos fazer algumas perguntas:
  • Sou um leitor?
  • Considero a literatura como manifestação artística e revelo isso aos meus alunos?
  • Envolvo-me com os livros de literatura, como me envolvo com os livros didáticos que utilizo em sala?
  • Leio os livros escolhidos e procuro me relacionar com eles enquanto leitor, antes de ser professor, ou tomo o volume nas mãos sem me preocupar em apreciar a obra?
  • Incentivo meus alunos a serem leitores de outras obras?
  • Incentivo meus alunos a visitarem livrarias e bibliotecas públicas?
  • Faço o mesmo comigo?
  • Faço uma "ponte" entre a literatura e a cultura (cinema, teatro, mu-seu)?
  • Promovo debates e permito que eles falem sobre o que está lendo?
  • Escuto o repertório cultural que eles têm?
  • Procuro levar em consideração a extensão da palavra "interpretação" para respeitar e compreender o pensamento de meu aluno?


Responder a essas perguntas é o primeiro passo para a consciência de uma prática de sala de aula mais consciente e prazerosa e, acima de tudo, mais transformadora.


O diagnóstico inicial: a sala de aula como espaço agradável

A sala de aula é o espaço onde as crianças ficam um turno do seu dia. Talvez, elas não passem tanto tempo seguido em companhia de ou¬tras pessoas, como passam na companhia do professor e dos colegas. Por isso, é necessário tornar esse espaço o mais aprazível possível.

Seria interessante que o espaço físico da sala de aula oferecesse aos estudantes uma condição material confortável para o estudo e a concen¬tração. Entretanto, não é só isso que define o espaço como "aprazível".

Um local agradável é aquele que abriga o desejo de ser interessante. Nele, o professor e o estudante se encontram para estabelecer trocas, se¬dimentar relações, aprender e (por que não?) ler literatura.

Consagrar a sala de aula como um espaço que promove alguns ra¬ros prazeres, como compartilhar uma boa leitura, é um bom começo para enredar o estudante numa rotina prazerosa e estreitar seus vínculos com a leitura.

A literatura aproxima as pessoas. Através dela poderemos conseguir, na prática, que os nossos alunos tenham desejo de frequentar a escola, de caminhar em direção a ela, curiosos pela nova história ou pela continua¬ção da história já iniciada pela professora. Por que não começar o turno de trabalho contando histórias? Sem rigor. Sem a obrigatoriedade de uma ati¬vidade, mas desejando essa atividade. Implicando as crianças nessa pro¬posta. Deixando que cada um contamine a sala com fadas, cavalos alados, bruxas e feiticeiros, guerreiros possantes, armas e flores, guerras e amores e todos os elementos que contam sobre a vida pelo viés da metáfora.


Local para os livros na sala de aula

Para que as crianças respeitem um objeto e construa com ele uma relação de troca é necessário que elas convivam com esse objeto. As crianças têm convivido pouco com os livros. Ou seja, o livro vem se transformando num objeto estranho à sua realidade e a seu cotidiano -

Teoria e prática da formação do leitor 85 deixando de se apresentar para a criança como um curioso objeto a ser explorado.

Existem algumas saídas para se criar na sala de aula um espaço destinado aos livros de literatura:

  • Antes de mais nada deverá ser dito ao grupo sobre a ideia da mi-nibiblioteca e as regras que farão parte do empréstimo dos livros.
  • Com uma mesa ou um pequeno espaço reservado no canto da sala, você pode criar uma minibiblioteca. Caso sua sala seja utilizada também por outro professor basta retirar os livros ao final da aula e os guardar em lugar seguro, para serem retomados no dia seguinte.
  • O número de livros pode ser variado. Com 15 livros você já pode co-meçar seu espaço. Esses livros deverão ser trocados a cada mês ou a cada dois meses, a depender da demanda dos estudantes. Cuidado! Os livros deverão ser selecionados pelo professor, com um critério que envolva a faixa etária e variedades dos gêneros textuais.
  • Os livros deverão estar no mesmo espaço todos os dias, não im-portando se a criança os toma para ler, ou não.
  • Num primeiro momento, não se deve exigir nenhum retorno dessa leitura. Ela deve ser incentivada, através de um comentário so¬bre o fragmento de alguma das histórias, uma provocação, do tipo "vocês não sabem a aventura que eu li nesse livro". É importante salientar que, para isso, o professor deverá estar em dia com a lei¬tura dos livros destinados à minibiblioteca.
  • Depois de sedimentada a ideia da "minibiblioteca", o professor poderá fazer pequenas provocações: quem quer escrever o resumo do livro que leu?, quem quer contar a história desse livro?, quem quer fazer uma lista dos melhores livros? O "quem quer" sinaliza para a não obrigatoriedade da tarefa.



A biblioteca da escola

Além do espaço reservado aos livros na sala de aula, é muito impor¬tante que as escolas possuam sua própria biblioteca. Esse espaço, comum a todos, deverá ser tratado com o máximo de respeito:

  • A biblioteca nunca deve ser usada como o espaço do bate-papo. Aquele aviso de "silêncio" vale para todos, mas ela não precisa se converter num espaço desagradável e temido onde ninguém pode falar.
  • É importante ser feito um trabalho permanente com as crianças para que aprendam a preservar o espaço e os livros.
  • Transitar entre livros literários e não literários é muito importante para o reconhecimento dos diferentes textos. Portanto, promova atividades livres, onde os estudantes possam se aproximar de toda qualidade de livro.
  • Possibilite trocas entre as diferentes turmas. A biblioteca é um ótimo espaço para isso. Mesmo entre as diferentes faixas etárias podem ser criadas atividades interessantíssimas, tendo na leitura da literatura um veículo de aproximação. Ex: os maiores contarem histórias para os menores.
  • O professor é modelo de postura. Se você leva seus estudantes à bi-blioteca e a utiliza como ponto de encontro para você, ou uma pausa no seu trabalho, não espere do estudante um comportamento diferente desse.
  • Além de livros, não se esqueça de ter gibis nesse espaço. O gibi já foi consagrado como literatura e vem se mostrando como um ótimo começo para se trabalhar a organização do pensamento sobre a sequência da narrativa. Cabe ao professor não permitir que esse seja o único interesse da criança.
  • Não subutilize as paredes da biblioteca. Use e abuse para pôr tudo que você encontrar sobre leitura e literatura: recorte de jornal, lista dos mais vendidos, fragmentos de catálogo de livros, com resumos e fotos, indicações de leitura feitas pelas próprias crianças, etc.
  • Faça rodas de leitura "de verdade". Ou seja, reúna o grupo, crie atividades de leitura em voz alta e interaja com eles num grande jogo. Cabe ressaltar a importância de programar bem o dia dessa atividade. Se houver um leitor na biblioteca, o professor deve ir para outro lugar, evidenciando o respeito que se deve ter por quem chegou primeiro no espaço.
  • Se, por algum motivo, a criança precisar se afastar da sala de aula, não a destine para a biblioteca. A biblioteca nunca deve ser associada a um lugar de castigo.
  • Por último, se a sua escola não tiver uma biblioteca, comece a "batalhar" por uma. Para isso, não idealize algo que você não possa alcançar. Espaços ideais, já vimos isso, não necessariamente são os mais bonitos ou equipados, mas são aqueles onde decidimos fazer um bom trabalho.
  • Peça doações à comunidade. Selecione com os próprios estudantes. Criar um espaço chamado biblioteca poderá envolver a escola inteira num projeto tão nobre e de tanta importância para todos.



Como iniciar um trabalho com leitura de literatura

Para dar início ao trabalho com leitura de literatura é muito impor¬tante que o professor se desapegue de alguns conceitos e comportamentos em relação à sua prática e ao trabalho com o texto escrito. É Bartolomeu Campos de Queirós (1997, p. 43) quem nos dá uma lição sobre isso:

A literatura (arte) não é servil. Ela só existe em liberdade, e seu compromisso é para com a revelação. Para tanto persegue a beleza. Daí, todas as vezes que a escola lança mão da literatura, quer transformá-la em "instrumento pedagógico", mesmo cortando as asas do leitor para um voo amplo, desme¬dido, desfronteirado. A escola reduz as funções maiores do texto literário e o transforma em objeto de convergência, sem escrúpulo. Se o texto é usado para saber aonde o autor quis chegar, é melhor pegar o telefone e perguntar ao escritor. Se ele souber, ele responderá e não haverá desperdício de tempo.

Transpondo esse trecho para o início de uma prática com a literatura, poderíamos começar fazendo algumas observações, que servem de trampolim para um mergulho nesse tema tão importante:
  • Antes de conduzir o seu aluno para o mundo da literatura que você considera de qualidade, você deverá se mostrar disposto a conhecer o dele.
  • Faça rodas de conversa. Nesse momento, deixe as crianças falarem sobre as coisas que gostam de fazer: sua rotina, seus lazeres, sua família, etc. Aproveite a ocasião para falar de você - seus lazeres, seu passatempo, seus livros prediletos. Com isso, haverá um aumento da interação entre vocês. E você, professor, poderá conhecer melhor sobre os motivos das dificuldades pedagógicas dos alunos.
  • Exercite a capacidade de escuta. Dessa forma você filtrará quais são os gostos literários de seus alunos, ou começará a apresentar para eles que determinados temas de interesse geral, como super-heróis, aventuras macabras e histórias de amor, estão contidas em livros.
  • Comece e/ou termine o dia lendo uma história. É uma forma sorridente de desejar boas-vindas ou dizer "até amanhã", além de tornar viva a palavra. Pesquisas indicam que a leitura em voz alta agrega o estudante em torno do texto, assim como desperta seu interesse para a escrita.
  • Decidir pela literatura como incentivo à leitura é escolher pela arte. E a arte, por sua vez, comunica-se diretamente com a cultura. Portanto, passeie por todas as artes e as conduza ao texto literário. Para isso, comente sobre teatro, sobre exposições, sobre cinema e sobre todas as atividades culturais e artísticas que estejam acontecendo em sua cidade.
  • Reserve uma parte do seu dia para trazer o livro como objeto de prazer. Desperte em seu estudante a curiosidade pelo livro. Se você for um professor preocupado em levar novidades desse tipo para sala de aula, a expectativa dele para suas aulas aumentará.
  • Não faça do intervalo das aulas um momento isento de contato com seus alunos. Observe as brincadeiras prediletas, os mais quietos, os mais agitados, converse com alguns, participe dos jogos. Crie um vínculo paralelo ao da prática pedagógica.



Avaliação inicial

Trabalhar com gente é descortinar a diversidade e a singularidade. Não podemos ignorar a questão da heterogeneidade de uma sala de aula.

Isso atrapalha? Depende de como encaramos esse fato. Visto por um ângulo, há a constatação de que o dia a dia da sala de aula é laborio¬so e muitas vezes cansativo; por outro, há a garantia do desafio e da riqueza dos resultados - caso saibamos aproveitar as diferenças.

Avaliar um estudante no trabalho com leitura e com literatura envolve aspectos que extrapolam os pedagógicos. Então, vejamos de que forma podemos acompanhar alguns deles:

Observe de que maneira se desenvolve a oralidade de seus estudantes nas rodas que você fizer em sala de aula.
Registre comentários interessantes que envolvam sua fantasia e seu pensamento criativo.
Num contingente de muitos estudantes, cuide para que você não se esqueça de registrar comentários de todos. Inclusive daqueles mais calados. É muito importante cuidar e incentivar os estudan¬tes mais retraídos, e a literatura ajuda bastante nesse sentido.

Monte uma ficha de avaliação que contenha os seguintes itens (segue uma sugestão de ficha-modelo):

fluência na leitura
estágio em que se encontra o leitor do ponto de vista pedagógico
comentários feitos sobre o texto (curiosos, criativos, normais, sem muito aprofundamento, etc.)
expressividade (inibido, expansivo, agressivo, invasivo, interessado, calado, etc.)
preferências literárias
possui algum lazer mais frequente?



- observações (aqui é importante que você coloque as suas impressões e seus sentimentos sobre o estudante)
Obs: Evitar resposta tipo SIM ou NÃO

Considerar que essa avaliação se faz a cada dia, ou seja, não estamos tratando de uma verdade que não se transforma. Pelo contrário, quando o assunto é literatura, as possibilidades de crescimento das crianças são constantes. Portanto, numere e date todas as fichas.


Guarde essa ficha com muito cuidado. Não deixe que ela circule ale-atoriamente, para evitar que dados momentâneos sobre o estudante se tornem verdades estigmatizadas sobre ele.

Periodicamente, reveja essa ficha e faça novos comentários sobre a evolução do estudante. Caso as alterações não sejam favoráveis, comente o que você pensa sobre isso. Não se preocupe tanto com teorias no mo¬mento de preencher essa ficha. O exercício de sua escrita sobre esse es¬tudante é o mais importante.


O texto escrito: o texto da literatura
Uma vez feita uma avaliação com o estudante, é necessário observar como a prática diária vem se posicionando com o texto escrito.

Observe de que maneira o texto é utilizado em sala de aula.
Liste as atividades que você vem desenvolvendo com o texto escrito, considerando a receptividade dos estudantes. Observe, cuidadosamente, aquelas em que os estudantes revelam maior resistência e tente identificar o porquê.
Comece a aproximar seus alunos do texto literário. Ofereça uma poesia num dia, uma crônica no outro. Sugira que eles tragam de casa algum texto de literatura que considerem interessante. Faça com que eles queiram participar.
De forma que o prazer sobre o texto não dissipe, aumente os de¬safios da aproximação com o texto da literatura, a cada dia. Colo¬que-os para criar textos. Mas muito cuidado para não pedagogizar a literatura.


O início de uma ação

Promover uma ação de leitura é muito diferente de discursar sobre a leitura. A sala de aula é repleta de pequenas e constantes surpresas que desorganizam o professor naquilo que ele havia planejado inicial¬mente. É importante ter consciência disso e tirar proveito das coisas que possam surgir.

Separe os livros de literatura que você pretende ler e procure traçar algumas atividades para eles, sem a interferência dos conteú¬dos da língua portuguesa. Ou seja, tente ver a literatura pela literatura e não a literatura como meio para alguma área de conhecimento. Leia todos esses livros.
Junto com os estudantes, faça um levantamento dos livros que existem na escola. Liste e coloque numa pasta.
Registre os livros que os estudantes já tenham lido. Da mesma forma, arquive esse documento.
Mostre para o grupo o número de livros lidos que foi levantado e lance o desafio: "como podemos aumentar esse número?" Aguarde respostas e registre os comentários.
Oficialize o dia em que vocês iniciaram o programa de leitura.
Determine um prazo, junto com o grupo, para reavaliar esse programa. Nesse dia, faça uma avaliação sobre o que está funcionan¬do bem e o que não está funcionando. Eles vão ter espaço e direi¬to para comentar sobre o programa de leitura, ao mesmo tempo em que você irá localizar como o grupo vem evoluindo.
Intercalando tudo isso, estarão acontecendo as técnicas de leitura (veja o próximo capítulo).
 

Os livros no alto da estante (Luciene Cerdas)

Na escola, devem ser promovidas situações diversificadas de leitura: ler para se informar, para adquirir e ampliar conhecimentos, para se comunicar, para se entreter... Enfim, a percepção inicial das crianças acerca da leitura como uma atividade prazerosa deve ser estimulada
"Emília estava na sala de Dona Benta, mexendo nos livros. Seu gosto era descobrir novidades - livros de figura. Mas como fosse muito pequenina, só alcançava os da prateleira de baixo. Para alcançar os da segunda, tinha de trepar numa cadeira. E os da terceira e quarta, esses ela via com os olhos e lambia com a testa. Por isso mesmo eram os que mais a interessavam. Sobretudo uns enormes" (Lobato, 1967, p. 3). A cena descrita por Monteiro Lobato se, por um lado, revela o desejo da boneca de entrar em contato com os livros, por outro representa o misto de prazer e frustração que essa atividade representa para aqueles que não podem chegar às estantes mais altas de nossa sociedade letrada. Entre os obstáculos ao universo da leitura e da escrita, que na ficção se reduzem às limitações físicas da pequenina personagem, está, na realidade, o analfabetismo.

Os índices de alfabetismo funcional e analfabetismo, apresentados em levantamentos como a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) e o Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional (INAF), ambos de 2009, tornam visível um cenário no qual 9,7% da população brasileira acima de 15 anos é analfabeta, o que corresponde a cerca de 14,1 milhões de pessoas.

Os indicadores revelam ainda que 52% dos brasileiros entre 15 e 64 anos que estudaram até o 4º ano do ensino fundamental atingiram apenas um grau rudimentar de alfabetismo: são capazes de localizar informações explícitas em textos curtos, mas não compreendem textos mais longos, nem localizam informações que exijam alguma inferência. Desse total, 9% são considerados analfabetos absolutos, embora tenham frequentado a escola. É a triste constatação de que o nível de escolaridade nem sempre garante ao indivíduo o domínio de habilidades e conhecimentos esperados.

Ainda que os índices mencionados revelem uma tendência de queda, se comparados com pesquisas anteriores, eles apontam que o acesso à escola não tem resultado necessariamente em uma ampliação significativa da aprendizagem de uma população que, por muito tempo, foi excluída da escola e que agora, apesar de ter acesso a ela, não consegue aprender ou enfrenta problemas para isso. Por aprender entende-se, em um momento inicial da escolarização, o domínio das habilidades básicas de leitura e escrita, ou seja, a decodificação/a codificação das letras e dos sons que pertencem à escrita alfabética.

Paradoxalmente, esses dados confirmam que a escolarização é o principal fator de promoção do letramento, uma vez que, quanto maior a escolaridade, maior é a chance de se atingir bons níveis de alfabetismo funcional. Daqueles que chegam à universidade, por exemplo, 71% demonstram pleno domínio das habilidades de leitura e escrita. É nessa ambiguidade que se reforça a importância da escola na formação de uma população leitora em uma sociedade complexa e cada vez mais exigente, na qual as novas tecnologias de informação e comunicação aceleram a velocidade com que as informações são veiculadas e transmitidas em variados suportes e em gêneros discursivos específicos.

Segundo a PNAD, o número de usuários da internet, no Brasil, mais que dobrou, passando de 31,9 milhões em 2005 para 67,9 milhões em 2009 - o Sudeste tem o maior percentual de usuários da internet (48,1%), enquanto as regiões Norte e Nordeste têm os menores percentuais (34,3% e 30,2%, respectivamente). A disseminação dessas tecnologias e as desigualdades tanto sociais quanto regionais no acesso a elas reforçam o papel da escola na promoção da alfabetização e do letramento das gerações futuras, visando também à inclusão digital da população.

Ao lado do analfabetismo, há outro obstáculo a ser encarado, que é a falta de estímulo à leitura. Diferentemente do que acontece com Emília - que, em suas aventuras pelo Sítio do Pica-Pau Amarelo, descobre novos mundos que Dona Benta tão carinhosamente desvela na leitura dos grandes volumes de sua estante -, a leitura costuma ser considerada uma tarefa escolar chata e cansativa. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil delineia um quadro de dificuldades que explicitam a formação precária das habilidades da leitura, como falta de concentração e paciência para ler, leitura lenta e ausência de compreensão do que se lê. Apesar disso, há uma progressiva valorização da leitura entre os indivíduos que avançaram em seu processo de escolarização. Segundo esse documento, o maior índice de leitura está entre aqueles com ensino superior.

O relatório também revela que o professor é um dos que mais influencia a formação de leitores, perdendo apenas para a mãe ou a mulher responsável pelos cuidados das crianças. Os professores exercem, portanto, um papel tão fundamental no incentivo à leitura quanto no ensino das primeiras letras. Acontece que eles nem sempre são bons leitores, apresentando fraco desempenho na recepção ou na produção oral e escrita de textos, inclusive em relação ao uso da internet. Também apontam dificuldades no acesso às tecnologias de informação ou revelam nunca terem utilizado a internet, segundo a pesquisa Perfil dos Professores Brasileiros, realizada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

A pesquisa mostra ainda que a leitura não está entre as atividades que os professores realizam com maior frequência, ficando atrás de assistir à televisão, ouvir rádio e escutar música em casa. Essa situação aponta mais um desafio a ser enfrentado quando se discute educação no Brasil, tendo em vista que, se os professores não leem, não estão em condições ideais para ensinar seus alunos a ler. Esse é um aspecto central a ser pensado na formação docente.

A escola desempenha um papel fundamental, que não vem sendo cumprido satisfatoriamente, no ensino da leitura e da escrita, em especial para aqueles indivíduos cujo contato com os materiais escritos é empobrecido por questões de desigualdade social e econômica. Ela deve contribuir para levar o aluno à condição de sujeito letrado, capaz de fazer uso da leitura e da escrita nas diferentes atividades pessoais, profissionais e sociais que exigem o domínio de tais habilidades: desde situações simples, como pegar um ônibus, ler um bilhete ou uma receita culinária, até a leitura de um artigo científico ou de um texto literário, esteja ele no papel ou em hipertexto.

A leitura como uma atividade prazerosa foi a resposta mais citada entre as crianças com idade de até 10 anos que participaram da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. Ler em voz alta para os alunos, sejam eles alfabetizados ou não, parece ser um dos caminhos que os professores devem trilhar nas salas de aula, almejando a criação de contextos significativos de aprendizagem que desafiem a criança a lidar com a diversidade de textos e inclusive com o aspecto lúdico da leitura, assumindo, assim, seu papel no desenvolvimento do hábito e do gosto de ler.

Primeiramente, o professor deve ter clareza de que o aprimoramento da leitura não prescinde da alfabetização, nem do conhecimento das regras e convenções que orientam a organização da leitura e da escrita, permitindo a produção de significados. À medida que esses conhecimentos são assimilados, menos energia os alunos despendem no processo de decodificação no caso da leitura e de codificação no caso da escrita, podendo canalizar seus esforços na compreensão de textos.

O professor deve incentivar o gosto pela leitura de livros e gêneros textuais diversificados, ler em voz alta para seus alunos, contar histórias, estimular as idas à biblioteca, valorizar a leitura como fonte de entretenimento e conhecimento, estimular o cuidado com os livros e outros materiais de leitura, trabalhar com diferentes tipos de gêneros e portadores de textos, incluindo-se aí o contato com o computador e o uso da internet. As práticas e os procedimentos didáticos realizados em sala de aula devem levar em conta que, quanto mais se lê, maior é a fluência na escrita, uma vez que a leitura alarga o repertório lexical, expressivo e estilístico do aluno. É preciso também incorporar às atividades de leitura o trabalho com os conteúdos de outras disciplinas, incluindo-se, por exemplo, textos informativos e científicos ao repertório de gêneros textuais, estimulando a curiosidade do aluno pelo conhecimento por meio da leitura.

Convém que o professor estabeleça relações entre os conhecimentos dos alunos sobre leitura e escrita e o trabalho realizado em sala de aula a fim de modificar e ampliar a percepção que eles têm sobre a função social dessas habilidades. Cabe lembrar que a aprendizagem da leitura e da escrita é um processo que se dá ao longo da vida e que se inicia antes da entrada da criança na escola, no contato que ela estabelece, em seu contexto familiar e social, com diferentes textos, sejam propagandas, anúncios, bilhetes, receitas ou hipertextos. A sala de Dona Benta repleta de livros é que desperta em Emília o desejo pela leitura. Essa imagem reforça a ideia de que as crianças recebem informações sobre as funções da leitura e da escrita na sociedade. Esse aprendizado, contudo, não tem data para terminar, já que se estende por toda a vida, ampliando a capacidade de assimilação de textos cada vez mais complexos.

Na escola, para além do domínio da escrita alfabética (um meio, e não o fim da educação), os alunos devem participar de situações diversificadas de leitura: ler para se informar, para adquirir e ampliar conhecimentos, para se comunicar, para se entreter... Enfim, a percepção inicial das crianças acerca da leitura como uma atividade prazerosa deve ser estimulada, não importa a que estrato social elas pertençam.

Sem dúvida, o ensino da leitura e da escrita desperta debates que se atualizam à medida que as demandas sociais para essa aprendizagem também se modificam. Discutir a função da educação na era digital revela essa atualização e possibilita pensar sobre velhos e novos desafios para a escola e para os professores, reconhecendo tensões presentes nessa discussão.

Há uma tensão entre as antagônicas representações que a escola tem recebido. De um espaço privilegiado para o aprendizado da leitura e da escrita, sobretudo para as camadas mais carentes da sociedade, ela tem figurado como espaço do fracasso, pois, ainda que venha sendo responsável pelo aumento dos índices de letramento da população, os números do analfabetismo evidenciam que a escola não tem cumprido seu papel.

Embora o acesso a ela tenha se alargado, muitos podem ser considerados analfabetos ou situados aquém do nível esperado, mesmo depois de frequentar a escola por alguns anos. Outra tensão pode ser verificada entre a comprovada influência dos professores no desenvolvimento do gosto pela leitura e a sua falta de preparo teórico e pedagógico para ensinar a ler e escrever, uma vez que também eles apresentam dificuldades nessas habilidades, como frutos desse mesmo sistema no qual estão atuando.

Em meio a essas tensões, a formação de leitores e escritores competentes envolve mais do que boa vontade dos professores, embora eles não estejam isentos de responsabilidade e de compromisso com a educação das crianças. Ela depende de ações conjuntas dos governos, das famílias e das escolas, visando a oferecer melhores condições de trabalho e remuneração para os professores, combater a exclusão social e melhorar o sistema educacional como um todo.

Nesse ambiente controverso, a universidade deve assumir um papel de destaque na formação de professores, já que eles precisam não só ser bons leitores, mas também saber como trabalhar com a leitura em sala se aula, tendo como horizonte a aprendizagem efetiva das crianças, em especial daquelas que mais precisam da escola. Como a boneca Emília, que busca "descobrir novidades", essas crianças desejam alcançar os livros "enormes" que ficam nas prateleiras mais altas.


Luciene Cerdas é mestre em Educação Escolar.
lucienecerdas@hotmail.com

REFERÊNCIAS

AMORIM, G. (org.). Retratos da leitura no Brasil. Imprensa Oficial, Instituto Pró-Livro, 2008. Disponível em: . Acesso em: 02 jun. 2011.

IBGE. Pesquisa nacional por amostra de domicílios 2009 (PNAD). Disponível em: . Acesso em: 02 jun. 2011.

INSTITUTO PAULO MONTENEGRO. Relatório INAF 2009: indicador de analfabetismo funcional - principais resultados. São Paulo, set. 2005. Disponível em: . Acesso em: 02 jun. 2011.

LOBATO, M. D. Quixote das crianças. São Paulo: Brasiliense, 1967.

UNESCO. O perfil dos professores brasileiros: o que fazem... São Paulo: Moderna, 2004.

A matemática na pré-escola por Terezinha Nunes

Devemos dar às crianças na pré-escola a chave que abre a porta da aprendizagem de matemática na escola, ajudando-as a compreender a natureza da representação numérica e o uso de números na resolução de problemas através de ações
A pré-escola tem o privilégio de abrir as portas da escola para as crianças, mas qual é a chave que abre a porta da aprendizagem da matemática? Quais são e de onde vêm as ideias matemáticas importantes que uma criança precisa compreender a fim de aprender matemática na escola?

A matemática ensina, entre outras coisas, a usar números para representar o mundo e pensar sobre ele. Embora tal premissa pareça simples, há nela duas ideias cruciais: representar o mundo usando números e usar os números para pensar sobre o mundo. Isso nos diz muito sobre o que podemos trabalhar com os alunos na pré-escola para que eles tenham a chave que lhes abrirá a porta da aprendizagem da matemática. Exploremos um pouco essas ideias.


Compreender que os números são usados para representar o mundo

Os números são usados para representar quantidades, e é certo que hoje, na pré-escola, os alunos sejam ensinados a contar. Contar corretamente exige algumas habilidades cognitivas: precisamos usar um sistema para contar cada um dos objetos, sem deixar de contar nenhum, ao mesmo tempo em que nos certificamos de que contamos cada um deles uma só vez. Quando terminamos a contagem, sabemos quantos objetos formam aquele conjunto. Porém, nossa habilidade de usar números para representar quantidades não se restringe a contar elementos e aplicar um rótulo à quantidade. Uma representação numérica deve servir para muito mais do que isso, uma vez que, a partir de números, podemos saber se duas quantidades são iguais ou não e qual delas é maior caso sejam diferentes.

Para tirar conclusões a partir de números, as crianças precisam compreender algo a respeito da representação numérica. A pré-escola é o lugar ideal para explorar as conclusões a que podemos chegar quando usamos números para representar quantidades.

As situações descritas a seguir podem ser usadas como motivação para trabalhar a compreensão da natureza da representação numérica, indo além da aprendizagem da rotina da contagem. Estudos pioneiros sobre como as crianças usam números para representar quantidades foram realizados por Piaget e estão descritos em seu livro sobre a concepção de número da criança. Muitos outros estudos foram feitos posteriormente, e seus resultados oferecem sugestões interessantes para o ensino de matemática na pré-escola.

Imagine a seguinte situação: uma criança reparte igualmente um conjunto de figurinhas entre dois amigos, Márcio e Paulo. Ela conta o número de figurinhas de Márcio e diz: "Ele tem 9". Se realmente compreender a função representativa dos números, ela deverá concluir que Paulo também tem 9, porque os dois receberam a mesma quantidade de figurinhas. No entanto, um estudo realizado na Inglaterra (Frydman e Bryant, 1988) demonstrou que apenas 40% das crianças de 4 anos sabem responder quantas figurinhas Paulo tem sem contá-las. Uma das ideias básicas para se compreender a natureza da representação numérica é que quantidades equivalentes são representadas pelo mesmo número, porém muitas crianças ainda não descobriram a importância da equivalência. Portanto, é essencial que na pré-escola a criança tenha a oportunidade de pensar sobre a função representativa dos números e a importância da equivalência nesse contexto.

Outra situação interessante refere-se à escolha do número que representa a quantidade após a contagem. Quando ensinamos as crianças a contar, basicamente lhes ensinamos uma rotina que envolve o uso da correspondência um a um e o uso do último rótulo numérico para representar o conjunto. Elas aprendem isso relativamente bem e são capazes inclusive de identificar os erros cometidos por um fantoche manipulado por um adulto que, por exemplo, contou o mesmo objeto duas vezes. Contudo, nem sempre compreendem que, se o boneco errou na contagem, o rótulo que o fantoche usar para representar a quantidade não representa o número de objetos no conjunto. Algumas crianças pensam que o número que o fantoche disse representa corretamente a quantidade, mesmo que o fantoche tenha contado errado (Freeman, Antonuccia e Lewis, 2000). Essa é outra questão a ser explorada com crianças pré-escolares com o objetivo de ajudá-las a pensar sobre a natureza da representação numérica: quando o fantoche contou um mesmo objeto duas vezes, qual será o número de objetos no conjunto?

Outras situações interessantes para se explorar a natureza da representação numérica envolvem variações em relação aos erros na contagem. Se o fantoche pular um objeto durante a contagem e terminar a contagem no número 7, quantos objetos esse conjunto tem? A dedução de que são 8 objetos é necessária para uma criança que compreende a natureza da representação numérica em nosso sistema de contagem. Porém, muitas crianças não conseguem chegar a nenhuma conclusão quanto ao número certo de objetos, mesmo tendo identificado o erro do fantoche durante a contagem.

E se o fantoche contar usando a correspondência corretamente, mas começar a contagem a partir do número dois? A que conclusão as crianças chegam quando se pergunta quanto objetos há no conjunto? Outra variação interessante explorada em estudos recentes foi usar um fantoche que contava de trás para frente. Por exemplo, dado um conjunto com 4 objetos, o fantoche apontava para os objetos e dizia 4, 3, 2, 1. A que conclusão as crianças chegam quando o fantoche conta de trás para frente? E se o conjunto tiver 4 objetos e o fantoche começar contando 5, 4, 3, 2?

Diferentes pesquisadores (Bermejo, Morales e deOsuna, 2004) mostram que refletir acerca do processo de contagem sob a orientação de um adulto influencia positivamente o desenvolvimento da compreensão da natureza da representação numérica. Após refletir sobre uma situação - por exemplo, a contagem a partir do número 2 -, as crianças demonstravam ser capazes de deduzir corretamente o número de objetos em outra situação - por exemplo, quantos objetos há no conjunto quando o fantoche contou o mesmo objeto duas vezes.

Além de ensinar a contagem na pré-escola como uma rotina fixa, o professor pode ainda criar situações que provoquem a reflexão sobre a representação numérica. Os estudos que investigaram essas situações envolveram alunos cujo conhecimento da contagem era relativamente restrito, não indo além de dez, mas estava bem-estabelecido nessa faixa numérica. Nos estudos em que a contagem foi executada erroneamente, ela foi feita por um fantoche, apresentado às crianças como um aluno novo que estava aprendendo a contar e que algumas vezes contava corretamente, mas outras vezes cometia erros. Como as crianças estavam ajudando o fantoche, estavam em uma situação social que lhes permitia dizer a ele que não havia acertado.


Aprender a usar os números para pensar sobre o mundo

Uma das contribuições mais relevantes da teoria de Piaget para a educação matemática foi sua hipótese de que a origem dos conceitos matemáticos elementares está na ação. Essa hipótese tem ampla aceitação hoje, e sua implicação para a educação pré-escolar é considerável. Para explicar melhor, consideremos um problema desenvolvido a partir de uma das questões originalmente estudadas por Piaget (Nunes e Bryant, 1997).

Eis o problema: apresentamos à criança uma fileira de casinhas (por exemplo, quatro) e dizemos que em cada casinha moram três coelhos. Pedimos a ela que tire de uma caixa o número certo de bolinhos de cenouras, de modo que possamos dar um bolinho para cada coelho. Esse problema exige raciocínio multiplicativo e pode parecer muito difícil para as crianças da pré-escola. Porém, mais da metade das crianças de 5 ou 6 anos consegue resolvê-lo corretamente. Nessa idade, elas compreendem que precisam estabelecer uma correspondência um a muitos entre casas e bolinhos. Como são três coelhos em cada casa, elas colocam três bolinhos diante de cada casinha, ou seja, resolvem o problema completamente através de ações.

Outras crianças contam bolinhos imaginários enquanto apontam para cada casinha: contam 1, 2, 3 em correspondência à primeira casa; 4, 5, 6 em correspondência à segunda casa, e assim por diante, resolvendo o problema através de uma combinação de ações e representação numérica. Outras conseguem até mesmo resolver o problema com lápis e papel, desenhando o número de bolinhos necessários para que cada coelho ganhe o seu. Entretanto, quando a razão entre coelhos e casas aumenta, o problema torna-se mais difícil.

À medida que as crianças resolvem problemas sobre quantidades, elas estão aprendendo a organizar suas ações para resolver problemas com números. Na pré-escola, elas devem ter a oportunidade de usar materiais concretos ou números, segundo sua preferência, e também desenhos. Os problemas devem ser variados e resolvidos por meio de ações diferentes, como juntar, separar ou distribuir objetos, pois assim elas terão a oportunidade de refletir sobre situações nas quais operações aritméticas diferentes são usadas.

É igualmente importante variarmos o elemento que não é conhecido na situação. Por exemplo, um problema de subtração pode dizer o número inicial de bolinhas de gude que um menino tinha e quantas ele perdeu, perguntando-se quantas bolinhas ele tinha no final. Pode-se ainda criar situações em que se pergunta quantas bolinhas ele perdeu. Por exemplo: um menino tinha oito bolinhas de gude. Ele colocou as bolinhas no bolso e foi visitar um amigo, mas o bolso estava furado. Quando chegou à casa do amigo, ele só tinha 5 bolinhas. Quantas bolinhas o menino perdeu no caminho?

Finalmente, convém usarmos situações-problema para promover a reflexão sobre a relação inversa entre adição e subtração, um conceito que está ao alcance de muitas crianças na idade pré-escolar, mas não é compreendido por todas elas quando ingressam na escola. Esse conceito serve de base a aprendizagens que terão lugar na escola. Podemos, por exemplo, mostrar às crianças um bastão feito com oito blocos amarelos e contar os blocos com elas para que saibam exatamente quantos blocos foram usados. Em seguida, escondemos o bastão embaixo de um pano, deixando apenas sua extremidade visível.

Sempre salientando nossas ações, para que as crianças acompanhem o processo, adicionamos quatro blocos vermelhos ao bastão e retiramos os quatro blocos. Então perguntamos a elas quantos blocos formam o bastão agora. Essa situação, em que os blocos somados e retirados são de cores diferentes, é simples e facilita a compreensão da relação inversa, pois a criança está observando a extremidade do bastão e verifica que nenhum bastão de cor diferente ficou no bloco. Quando a situação já foi compreendida, podemos aumentar progressivamente sua dificuldade, usando blocos da mesma cor, adicionando e retirando um número de blocos que difere em uma unidade (por exemplo, adicionando 3 e retirando 2) e adicionando os blocos em uma extremidade, mas retirando-os da outra. É fundamental estimular a criança a resolver o problema sem contar.

Nossos estudos (Nunes et al., 2007) mostraram que as crianças que ingressam na escola com uma boa compreensão da relação inversa entre adição e subtração, assim como uma boa habilidade de resolver problemas usando ações e contagem, têm uma ótima chance de sucesso na aprendizagem de matemática. Portanto, devemos dar às crianças na pré-escola a chave que abre a porta da aprendizagem de matemática na escola, ajudando-as a compreender a natureza da representação numérica e o uso de números na resolução de problemas através de ações.


Terezinha Nunes é professora do Departamento
de Educação da Universidade de Oxford (Reino Unido).
terezinha.nunes@education.ox.ac.uk

REFERÊNCIAS

BERMEJO, V.; MORALES, S.; deOSUNA, J.G. Supporting children's development of cardinality understanding. Learning and Instruction, n. 14, p. 381-398, 2004.

FREEMAN, N.H.; ANTONUCCIA, C.; LEWIS, C. Representation of the cardinality principle: early conception of error in a counterfactual test. Cognition, n. 74, p. 71-89, 2000.

FRYDMAN, O.; BRYANT, P.E. Sharing and the understanding of number equivalence by young children. Cognitive Development, n. 3, p. 323-339, 1988.

NUNES, T.; BRYANT, P. Crianças fazendo matemática. Porto Alegre: Artes Médicas, 1997.

NUNES, T. et al. The Contribution of logical reasoning to the learning of mathematics in primary school. British Journal of Developmental Psychology, n. 25, p. 147-166, 2007.

Disponível em: http://www.revistapatio.com.br/sumario_conteudo.aspx?id=341